Pesquisadora premiada pela FAPEMA analisa dados de coinfecção em Imperatriz
Lívia Fernanda Siqueira Santos
Mestre em Saúde e Tecnologia (UFMA). Graduação em Enfermagem pela Universidade CEUMA e especialização em Saúde da Família pela Universidade Federal do Maranhão (UFMA). Tem experiência na área Hospitalar como Enfermeira Assistencialista. Atuou em Hospital Geral/Urgência/Emergência (Hospital Municipal de Imperatriz) e na Atenção Primária à Saúde como membro da Estratégia Saúde da Família dos municípios maranhenses de Amarante e Imperatriz.
A tuberculose é uma doença infecciosa e transmissível que afeta prioritariamente os pulmões e é causada pela bactéria Mycobacterium tuberculosis, também conhecida como Bacilo de Koch. É uma doença muito antiga: originada a partir do primeiro gado domesticado, a tuberculose infecta a humanidade desde o começo da civilização. Foi identificada como uma única patologia ao ser batizada, em 1839, pelo professor alemão de medicina Johann Lukas Schonlein. Em 1882 o bacilo causador da doença foi descrito pelo patologista e vencedor do prêmio Nobel de Medicina, Robert Koch.
A transmissão da tuberculose acontece através da tosse, fala ou espirro do paciente sintomático. Os principais sintomas são: tosse (com ou sem catarro) durante 3 semanas ou mais, febre baixa (geralmente durante a noite), perda de apetite e de peso, suores noturnos e fraqueza. Segundo dados do Ministério da Saúde, cerca de 70 mil casos são registrados todos os anos no Brasil e cerca de 4 mil pessoas morrem anualmente em decorrência da doença.
Desde o século XX, o combate à tuberculose não se restringe apenas à prevenção. Já existe o tratamento com base em 4 medicamentos (rifampicina, isoniazida, pirazinamida e etambutol) durante o período de 6 meses. O tratamento à base de antibióticos foi desenvolvido em 1946 e foi um dos fatores determinantes para reduzir, significantemente, o número de mortes. Porém, uma infecção viral, descoberta na década de 80, fez com que esta doença milenar prosseguisse como uma grande ameaça até os dias de hoje: a AIDS.
A síndrome da Imunodeficiência Adquirida (SIDA, ou AIDS, de acordo com a sigla em inglês) é uma doença crônica que afeta o sistema imunológico, ou seja, afeta a capacidade do organismo se defender contra infecções. A doença se desenvolve no estágio mais avançado da infecção por HIV, que é um vírus sexualmente transmissível. Ele também pode ser disseminado pelo contato com o sangue contaminado ou, de mãe ao filho, através da gravidez e amamentação.
Com o sistema imunológico comprometido, os indivíduos portadores de AIDS são mais suscetíveis a infecções “oportunistas”, já que seu organismo não consegue produzir anticorpos para combater fungos, bactérias ou outros vírus. Essas Infecções são a principal causa de morte para os portadores de HIV e, dentre elas, a tuberculose é a principal. A chance de um portador de HIV infectado pelo bacilo de Koch desenvolver a doença da tuberculose é 26 vezes maior que a média e a coinfecção (infecção simultânea) TB-HIV aumenta os riscos de falência do tratamento, reincidência e resistência a medicações.
Buscando fornecer dados que possam orientar o planejamento de ações de prevenção e controle da coinfecção TB/HIV, a pesquisadora Livia Fernanda Siqueira Santos produziu, durante o seu mestrado em Saúde e Tecnologia pela Universidade Federal do Maranhão – Campus Imperatriz, a dissertação que foi premiada na última edição do prêmio FAPEMA, na categoria Ciências da Saúde.
O trabalho “Coinfecção Tuberculose/HIV em cenário do Nordeste brasileiro: tendência da prevalência, distribuição espacial e fatores associados” foi orientado pelo professor Marcelino Santos Neto, doutor em Ciências – Saúde Pública pela Universidade de São Paulo. Consistiu em um estudo ecológico e de séries temporais baseado em dados coletados do Serviço de Vigilância em Saúde (SVS) da Unidade Gestora Regional de Saúde de Imperatriz (UGRSI), com registros relativos à maior cidade do oeste do Maranhão. “Foram levantados casos de TB notificados entre 1° de janeiro de 2008 e 31 de dezembro de 2019, sendo incluídos casos de TB que realizaram teste anti-HIV e excluídos casos de notificação de TB com anti-HIV não realizado e em andamento”, explica a pesquisadora. “As variáveis sociodemográficas e clínicoepidemiológicas foram selecionadas da ficha de notificação individual de TB”, complementa. Além disto, foi realizado um processo de geocodificação para “mapear” as regiões da cidade em que a coinfecção foi registrada.
Resultados
Dos 947 casos de tuberculose registrados, entre janeiro de 2008 e dezembro de 2019 em Imperatriz, 501 realizaram o teste de HIV e 73 foram positivos. Durante o período, houve dois dados significativos: o número de realizações de testes de HIV passou de 22,6% dos pacientes registrados com tuberculose em 2008 para 88.6% em 2019. A prevalência da coinfecção, por sua vez, passou de 41.7% em 2008 para 7.1% em 2019. “O Plano Nacional de Controle da Tuberculose (PNCT), em consonância com a Organização Mundial da Saúde (OMS), recomenda a realização do teste anti-HIV para todos os pacientes com TB, para aqueles com sinais e sintomas de TB e, ainda, aos parceiros de pacientes com TB-HIV positivos, considerando que a notificação fidedigna de coinfectados é essencial para o planejamento adequado de medidas de controle e o cuidado integral do paciente”, explica Lívia.
A prevalência média da coinfecção TB/HIV em Imperatriz, no período, foi de 20%, acima da média européia (4.9%), norte-americana (6%) e brasileira (9.5%). Apesar de acima da média, a tendência decrescente da coinfecção acompanhou as quedas globais e nacionais observadas nas últimas décadas. Porém, os dados permanecem distantes das metas pactuadas pelas organizações de saúde mundiais para erradicar tanto a tuberculose quanto o HIV.
Através da geolocalização também foi possível fazer uma análise espacial dos dados obtidos. A partir do que foi observado, residentes do perímetro urbano tiveram quase 3 vezes mais chances de serem coinfectados do que os moradores da zona rural: “Essa relação sugere que o estilo de vida mais ativo e a maior aglomeração nos espaços urbanos, assim como o aumento da urbanização, comportam-se como fatores de risco que potencializam a perpetuação de ambos os agravos”, analisa a pesquisadora.
Outro fator preocupante observado pela pesquisa está associado ao abandono do tratamento. Pacientes coinfectados tiveram cerca de dez vezes mais chances de abandonar o tratamento quando comparados aos pacientes anti-HIV negativos. “O abandono do tratamento, considerado um dos principais obstáculos e um desafio para o combate à doença, tem sido um sério problema apontado entre coinfectados TB-HIV e apresenta como consequência direta o aumento do custo do tratamento, da mortalidade e das taxas de recidiva, além de facilitar o desenvolvimento de cepas de bacilos resistentes”, destaca.
Reconhecimento
Premiada no prêmio FAPEMA na categoria dissertação de mestrado – Ciências da Saúde, Lívia sente que teve o seu esforço reconhecido. “Sem dúvidas a premiação é motivadora e gratificante, pois se trata de um reconhecimento de um trabalho fruto de esforço e dedicação de um grupo de pesquisa que tem trabalhado na vertente de estudos epidemiológicos de doenças transmissíveis e não transmissíveis no estado do Maranhão. A FAPEMA tem sido uma excelente fundação, parceira e financiadora dessas propostas que vêm sendo conduzidas e sinto-me motivada em dar continuidade em estudos dessa natureza”, conclui a pesquisadora.