Revista Inovação FAPEMA

Ostreicultura como ferramenta inclusiva em quilombo maranhense

A pesquisa nasceu por demanda da própria comunidade

Ostra nativa Crassostrea gasar com tamanho comercial após 270 dias de cultivo

Paulo Protásio de Jesus

Mestrando no Programa de Pós-Graduação em Entomologia da Universidade Federal de Viçosa (UFV). É licenciado em Ciências Agrárias pelo IFMA – Campus São Luís Maracanã. Tem experiência na área de Entomologia, atuando principalmente nos temas Acarologia, controle biológico, ácaro-predadores e biopesticidas. Entre 2018 e 2021 integrou o Núcleo de Maricultura (NUMAR/IFMA), onde participou de projetos de pesquisa e extensão na área de aquicultura e etnoconhecimento de comunidades tradicionais.

A ostreicultura, ou cultivo de ostras, representa um ramo da aquicultura que vem se destacando como um negócio viável para o desenvolvimento das comunidades de pescadores artesanais e quilombolas. Atualmente, o ciclo reprodutivo das ostras gira em torno de 6 a 8 meses e, se bem manejado, cada suporte para cultivo, conhecido como travesseiro (fixo ou flutuante), finaliza com 400 ostras adultas, resultando, ao final, num total de 456.000 ostras. 

De acordo com o “Manual de Boas Práticas: qualidade e segurança para bons negócios”, desenvolvido pelo Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas – Sebrae, existem duas espécies de ostras nativas que podem ser cultivadas no Nordeste do país: a ostra preta (também chamada de ostra da lama e que tem o nome científico de Crassostrea gasar ou Crassostrea brasiliana) e a ostra branca (também chamada de ostra da pedra e cujo nome científico é Crassostrea rhizophorae).

Com a intenção de promover a difusão da ostreicultura como tecnologia social, o mestrando Paulo Protásio de Jesus realizou pesquisa com formação teórica e prática para implantação de sistemas de cultivo de baixo custo junto às Comunidades Remanescentes de Quilombos do município de Bequimão, litoral ocidental do Maranhão.

Ele tem como objetivo, ainda, impulsionar o desenvolvimento socioeconômico, o empreendedorismo com inclusão nas principais cadeias produtivas de maneira sustentável e a diminuição dos impactos da tecnologia no meio ambiente.

Aprovado em 2017, o projeto iniciou as atividades em 2018, foi finalizado em 2020 e conquistou o Prêmio Fapema 2021 – Mulheres Cientistas do Maranhão: Ana Angélica Macêdo, Luciane Brito e Zafira de Almeida, na categoria Jovem Cientista, área de Ciências Agrárias.

O trabalho apoiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa e ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico do Maranhão (FAPEMA), por meio do edital nº 040/2017 – Inclusão Produtiva Quilombola foi orientado por Izabel Cristina da Silva Almeida Funo. Doutora em Recurso Pesqueiro e Aquicultura pela Universidade Federal Rural de Pernambuco, ela é professora do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Maranhão (IFMA) – Campus São Luís/Maracanã.

 

De acordo com Paulo Protásio de Jesus, a pesquisa nasceu de uma demanda das próprias comunidades quilombolas de Bequimão, que já praticavam a captura da ostra nativa nos estuários do município. Por meio de contatos com o IFMA Campus Maracanã foram realizadas as primeiras reuniões de um extenso projeto de ensino, pesquisa e extensão. “Esse projeto veio para diminuir as ações antrópicas nos estoques naturais de recursos pesqueiros, visando a garantia desse recurso às futuras gerações”, pontuou o pesquisador. “Ele também cria alternativas produtivas de baixo custo, condizente com a realidade das comunidades quilombolas, a fim de gerar trabalho e renda e, consequentemente, retorno econômico, inclusão social e qualidade de vida”, prosseguiu. “Também promove a inclusão das comunidades quilombolas na cadeia produtiva da aquicultura, de modo a incentivar a produção de alimentos saudáveis, de forma sustentável e minimizar os índices de pobreza e insegurança alimentar nesses espaços tão esquecidos e/ou negligenciados”, prosseguiu. 

Metodologia da pesquisa

 Na primeira fase do projeto foi realizado o levantamento do perfil demográfico, social, econômico e ambiental das 11 (onze) comunidades remanescentes de quilombos do município de Bequimão. “Nesta fase, usamos o questionário semiestruturado como instrumento de coleta de dados, o qual foi aplicado a uma amostra de 144 quilombolas”, indicou Paulo Protásio.  

Em seguida foi ofertada formação teórica e prática em ostreicultura às comunidades quilombolas. “Nesta etapa realizamos oficinas com 20 pessoas de cinco famílias quilombolas, quando abordamos os aspectos biológicos da ostra, obtenção de suas sementes, construção e a implantação de sistema de cultivo, acompanhamento de um ciclo de cultivo de ostra e o monitoramento da qualidade da água, totalizando uma carga horária de 200 horas”, informou o pesquisador. 

A fase final da pesquisa se deu com a construção e implementação de um sistema de cultivo de ostras de baixo custo. “Essa fase se constituiu pela vivência prática da formação, caracterizada pela construção e implantação de uma unidade experimental de cultivo de ostras, composta de um sistema de cultivo fixo (cama), localizado no estuário de Paricatíua, município de Bequimão”, pontuou Paulo. “Nessa unidade experimental, o grupo capacitado acompanhou o recrutamento de sementes de ostras e um ciclo de cultivo desse molusco, com duração de 270 dias”, destacou.

Resultados obtidos

A pesquisa gerou, entre outros benefícios, a materialização de uma monografia, um livro e uma cartilha ilustrada, que foi amplamente divulgada e distribuída nas comunidades. Segundo Paulo Protásio de Jesus, por meio do levantamento do perfil sociodemográfico, econômico e ambiental, informações importantes sobre a realidade das comunidades ficaram mais acessíveis e estão sendo utilizadas pelos órgãos competentes na formulação de políticas públicas mais pontuais visando a sanar os principais problemas que permeiam as comunidades, relacionados à saneamento básico, insegurança alimentar e escolaridade. 

Ele ressalta que, por meio da formação teórica e prática, foi possível difundir na região uma forma alternativa de renda, através do cultivo de ostras. “Houve benefícios econômicos e ambientais, além da inclusão social, uma vez que a atividade pode ser realizada por todos os membros familiares, inclusive as mulheres que até então se ocupavam dos afazeres domésticos e de pequenas plantações próximas de suas casas”, destacou. “Os quilombolas também tiveram mais contato com uma atividade aquícola rentável, sustentável e adaptada às limitações financeiras da região, por meio da tecnologia social com um sistema de cultivo de ostras de baixo custo que utiliza materiais encontrados nas comunidades,”, complementou o pesquisador.

Paulo Protásio espera que o trabalho sirva de subsídio à implantação da aquicultura no município de Bequimão como atividade fixa, economicamente viável e sustentável, como destaque principalmente para a ostreicultura (cultivo de ostras). Em sua avaliação, isso possibilitaria que as comunidades quilombolas daquela região passassem a integrar a cadeia produtiva da aquicultura, com a obtenção de retorno financeiro ao desenvolverem as suas atividades.

Fomento da Fapema

Para Paulo Protásio de Jesus, o apoio financeiro da Fapema foi essencial para o projeto pois possibilitou a aquisição dos materiais de consumo e equipamentos, além da concessão de diárias que viabilizaram as viagens de São Luís até o município de Bequimão, no litoral ocidental maranhense. “Para aplicação dos questionários, por exemplo, houve gastos com passagens, hospedagens e alimentação dos alunos, além do material de apoio como impressão de questionários, canetas e pranchetas”, relembra.

Na formação teórica, houve gastos com impressão de material didático, compra de computadores, retroprojetores, lapiseiras, entre outros. Na formação prática, houve gastos com compra de equipamentos para produção e instalação do sistema de cultivo, materiais para realização do manejo, além de equipamentos para realização da biometria das ostras, tais como balanças e paquímetros. “Todos esses materiais e equipamentos foram adquiridos com recursos repassados pela Fapema e materializaram a realização deste trabalho”, ressaltou.

O pesquisador destacou que o grupo de pesquisa em que está inserido se propõe a dar continuidade ao desenvolvimento do projeto na região estudada, bem como em outras comunidades tradicionais no litoral maranhense. “Para darmos prosseguimento à pesquisa, aguardamos por editais que estimulem pesquisas aplicáveis à inserção de comunidades tradicionais na dinamização das cadeias produtivas no estado, além de incentivar a tecnologia e inovação voltadas à inclusão produtiva no Maranhão”, finalizou.

O pesquisador destacou, ainda, a atuação da Fapema diante do cenário atual brasileiro, em que a ciência vem sendo menos valorizada, com cortes sucessivos de financiamentos. “Tornou-se comum observar pesquisadores sendo obrigados a abandonarem seus projetos de pesquisa, o que acaba impactando diretamente toda a população brasileira. “Observando tudo isso, é preciso valorizar as instituições que ainda fomentam a pesquisa no país, como a Fapema, que vem se destacando no cenário nacional como uma das instituições que mais financiam a pesquisa científica”, afirmou. “Fui bolsista de Iniciação Científica por três anos consecutivos durante a graduação, com apoio da Fapema e afirmo que a oferta da bolsa de Iniciação Científica foi essencial para minha permanência tanto no projeto, como, também, no curso de Licenciatura em Ciências Agrárias do IFMA – Campus Maracanã”, reconheceu Paulo Protásio.

 

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