Revista Inovação FAPEMA

Estudo aponta a visão ambiental de catadores de mariscos em manguezais

A pesquisa foi realizada no município de São José de Ribamar, região metropolitana da capital maranhense

Estudo aponta que 38,3% dos entrevistados afirmam capturar os sururus independente do tamanho

Jhony Christyan Medeiros de Sousa

Técnico em aquicultura pelo IFMA Campus Maracanã, cursa Engenharia de Aquicultura na Universidade Federal de Santa Catarina. Atua em projetos de pesquisa e extensão em comunidades de pescadores e marisqueiros, voltados para levantamento de conhecimentos tradicionais e aspectos socioeconômicos.

O Manguezal é um ecossistema único, comum em regiões tropicais e subtropicais e que possui características tanto de ambientes terrestres quanto marinhos, sendo considerado uma região de transição entre os dois. A vegetação é adaptada para resistir ao fluxo marítimo e à água salgada e o solo lamacento é rico em matéria orgânica, permitindo que várias espécies de animais exclusivas desse ecossistema se desenvolvam. Além de sustentar uma grande cadeia alimentar, os manguezais também fazem a filtragem de poluentes, ajudando a melhorar a qualidade da água. 

O Maranhão possui a maior área de manguezal do Brasil, sendo responsável por 36% de todo esse bioma no país. Apesar disso, esse ecossistema vem sendo muito degradado ao longo dos anos. Segundo dados do Departamento de Oceanografia e Limnologia da Universidade Federal do Maranhão (UFMA), só em São Luís, entre 1972 e 2015, houve uma perda de 18 mil hectares na área de mangues, o que representa mais da metade da área anterior de 35 mil hectares. 

Preservar os manguezais têm uma importância que vai muito além da questão ambiental, já que também é o local que fornece condições de sobrevivência a centenas de famílias de marisqueiros em todo o estado. Essa coleta de mariscos é uma atividade tradicional, passada de pai para filho, que é realizada de forma rudimentar, com o uso de pás, colheres, garfos, baldes, facas e outros utensílios domésticos.

Depois de anos de exploração sem planejamento ou controle, a população desses mariscos diminui a cada ano, colocando em risco não só a complexa cadeia alimentar da qual fazem parte como também o sustento dessas comunidades tradicionais. 

Foi pensando nestas comunidades que Jhony Christyan Medeiros de Sousa realizou o estudo “Gente da Maré: um olhar sobre a percepção ambiental de marisqueiros”, que ganhou o prêmio Fapema 2021 na categoria Pesquisador Júnior.  No estudo, Jhony entrevistou catadores de Sururu de São José de Ribamar sobre o impacto de suas práticas no ecossistema, além da importância da preservação dessa espécie de marisco. 

O reconhecimento do seu trabalho científico foi, para o estudante, uma fonte de orgulho e inspiração. “Receber esse prêmio no início da minha jornada como pesquisador foi uma grande honra e extremamente gratificante e eu o encaro como um incentivo para a minha carreira profissional.” explica o jovem cientista.

 

O estudo

Sendo a coleta de mariscos uma atividade informal, não existe nenhuma forma de registro confiável acerca da quantidade exata de pessoas envolvidas com a prática, o que torna a delimitação da amostragem para a pesquisa uma tarefa muito difícil. Para conseguir alcançar o maior número de pessoas, Jhony utilizou o método bola de neve, em que cada entrevistado também indicaria mais trabalhadores com o mesmo perfil. Assim, a partir do contato com algumas pessoas encontradas trabalhando no mangue,  a pesquisa do estudante do IFMA alcançou 75 marisqueiros. 

Com os dados obtidos, foi possível ter uma ideia do perfil socioeconômico dos catadores do município de São José de Ribamar. Com uma média de idade de 37 anos, os marisqueiros possuem uma escolaridade baixa (quase metade não possui nem mesmo o ensino fundamental completo) e uma renda baixíssima (72% recebe menos de um salário mínimo por mês), sendo dependentes de auxílios governamentais para o complemento da renda. O estudo demonstra, portanto, que a comunidade de catadores se encontra em uma situação de vulnerabilidade social.

Após a coleta dos questionários, o estudante utilizou as respostas dos marisqueiros para delimitar o nível de percepção ambiental desses trabalhadores. A percepção ambiental é, em termos simples, a capacidade de compreender os fenômenos bióticos e abióticos de uma região, assim como o impacto da ação humana sobre esse ambiente.

Para os catadores de marisco, a percepção ambiental é muito necessária, uma vez que sua atividade afeta diretamente a população de animais que eles precisam preservar para manter a própria fonte de sobrevivência. A população de Sururu em São José de Ribamar vem diminuindo muito ao longo dos anos, mas essa redução foi observada por apenas 48% dos marisqueiros entrevistados. E 45% deles ainda afirmam que não houve diminuição alguma (7% não souberam responder).

A população do marisco diminui por uma série de razões e a principal é a constante ameaça que o ecossistema do manguezal sofre com a ação humana. O avanço urbano desordenado suprime o ecossistema por meio de aterros e desmatamento. Além disso, os manguezais que ainda existem são afetados pelo descarte irregular de esgoto e lixo doméstico, pois a poluição é absorvida pela vegetação e transmitida aos animais. 

Dentre todas essas razões para a escassez de mariscos, algumas delas passam pela forma como os marisqueiros realizam a sua atividade. O uso de pás possibilita a captura de vários sururus de uma só vez, mas também faz com que mariscos muito jovens sejam retirados do solo e descartados por não estarem no tamanho adequado para a venda. A maior parte dos catadores prefere coletar os mariscos maiores, já que são os que possibilitam maior lucro, mas como é um trabalho intenso e desgastante, 38,3% dos entrevistados no estudo afirmaram capturar todos os sururus independente do tamanho.

O problema é que a retirada desses organismos ainda jovens não permite que eles se reproduzam e mantenham a sua população estável. “Muitos dos catadores têm a consciência dos impactos negativos de sua atividade para o meio ambiente e, por isso, alguns optam por catar apenas os sururus  maiores, pois para é visível a diminuição dos mariscos nos bancos naturais”, explica Jhony. “ Porém, grande parte dos marisqueiros catam o sururu de qualquer tamanho, pois não é uma atividade regulamentada na região”, prosseguiu. 

Ao final do seu trabalho, o estudante concluiu que muitos marisqueiros não percebem como a sua atividade afeta o ambiente à sua volta. A coleta indiscriminada do sururu pode fazer com que, em breve, a população desse marisco já não seja suficiente para garantir a subsistência das famílias que dependem desse ecossistema. A solução para isso passa por regulamentação da atividade e, principalmente, por políticas públicas. “Sugerimos ação de educação ambiental para esses marisqueiros junto às escolas locais, colônias e associações de pescadores do município”, concluiu Jhony.

 

Um comentário

  1. Ana

    Excelente a pesquisa do jovem Jhony. Um trabalho excelente executado com riqueza de detalhes, o que proporciona ao leitor uma visão real do que faz e pensa o trabalhador que sobrevive da extração de mariscos. Parabéns a Revista Fapema pela matéria e ao jovem Jhony Sousa que com esse trabalho foi premiado em primeiro lugar pela Fapema, na categoria pesquisador júnior..

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