Revista Inovação FAPEMA

Leishmaniose: pesquisadora maranhense estuda a resistência química do parasita

O estudo avaliou a tolerância de cada uma das cepas ao contato com a anfotericina

O estudo utilizou ferramentas metabolômicas para caracterização molecular de parasitos

Juliana Mendes Sousa

Graduada em Ciências Biológicas pela Universidade Federal do Maranhão (UFMA). Foi bolsista do Programa de Educação Tutorial (PET Biologia), onde executou projetos de ensino, pesquisa e extensão, entre 2017 e 2021. Foi revisora do periódico Boletim PET Bio, estagiária do Laboratório de Genética e Biologia Molecular da UFMA. Integrou o Grupo de Estudos em Biotecnologia e Genética, onde desenvolveu trabalhos voltados para sensibilidade fenotípica de parasitos do gênero Leishmania e avaliação de perfil metabolômico de cepas isoladas de pacientes com leishmaniose visceral. Tem interesses nas áreas de pesquisa em parasitologia, biotecnologia, biologia molecular e genética com ênfase em doenças infecciosas negligenciadas.

Com a pandemia do coronavírus, a saúde pública voltou para o centro do debate público, na medida em que toda a sociedade precisou unir forças para salvar o máximo de vidas possíveis, mesmo diante de uma doença que ninguém havia enfrentado antes. Após mais de dois anos de trabalho incansável por parte dos pesquisadores de todo o mundo, foram feitas várias descobertas e até mesmo as vacinas foram produzidas em tempo recorde, mas a realidade é que ainda há muito o que aprender. Na ciência nada acontece da noite para o dia e os avanços acontecem ao longo de anos, a cada nova pesquisa. 

Os pesquisadores maranhenses, por exemplo, têm estudado, nas últimas décadas, uma doença que ainda atinge milhares de pessoas e animais no estado: a Leishmaniose. Mesmo com toda a bibliografia que já existe sobre o tema, cientistas veteranos e iniciantes ainda produzem trabalhos inéditos e relevantes para o enfrentamento dessa enfermidade que já tem cura, mas ainda mata.

A Leishmaniose é uma doença infecciosa não contagiosa causada por parasitas do gênero Leishmania. Ela pode ser tanto cutânea quanto visceral. No primeiro caso ela é caracterizada por feridas no nariz, boca e garganta, enquanto no segundo as feridas acontecem internamente, no fígado, baço e medula óssea. A transmissão da doença é realizada através de insetos que se alimentam de sangue, como o mosquito palha. Assim, ao ingerir sangue de pessoas ou animais infectados, ele pode transmitir o parasita para pacientes sadios. 

O Maranhão, devido ao clima propício para o crescimento da população desse tipo de inseto, é o estado que mais sofre com a Leishmaniose. Segundo dados do Ministério da Saúde, entre 2017 e 2019, foram 1676 casos confirmados (mais de 400 casos a mais do que o Pará, que ocupa a segunda posição). A relevância do tema para o estado instigou a pesquisa de Juliana Mendes Souza, premiada na categoria Jovem Cientista. 

Perfil metabolômico e resistência a medicamentos

No Brasil, o número de fármacos aprovados para tratamento da Leishmaniose é muito limitado, dificultando o trabalho do profissional de saúde se os tratamentos disponíveis não surtirem efeitos. E, infelizmente, no caso dessa doença parasitária isso é muito comum. Pode ser o caso do medicamento não funcionar ou de haver problema com a sua eficácia ou, ainda, uma resistência do parasita a esse tipo específico de tratamento. Juliana buscou analisar a segunda opção, expondo diferentes cepas do parasita ao medicamento mais comum utilizado contra a Leishmaniose: a anfotericina B.

As amostras dos parasitas foram coletadas através de uma parceria com o Hospital Presidente Vargas, que é um centro de renome no combate de doenças negligenciadas no Maranhão. Ele cedeu amostras do material mais utilizado para diagnóstico de leishmaniose: a medula óssea de pacientes infectados. “A gente pegou uma parte deste material biológico e fizemos o que a gente chama de isolamento, que é quando a gente pega um pouquinho desta medula, coloca no meio de cultura e espera as leishmanias saírem para que a gente consiga tirar os parasitas dali e fazer os experimentos”, explica Juliana.

Com as amostras coletadas, começou a etapa de exposição dos parasitas ao medicamento. A pesquisadora avaliou a tolerância de cada uma das cepas ao contato com a anfotericina e, depois, avaliou o perfil metabolômico de todas as amostras para tentar entender porque alguns resistiram mais que os outros.

“Foi observada a ocorrência de heterogeneidade na sensibilidade in vitro à anfotericina B em isolados clínicos de Leishmania infantum, indicando a presença natural de variabilidade intraespecífica nos parasitos circulantes no Maranhão”, apontou Juliana.

A pesquisadora ressaltou o caráter inédito do estudo na utilização de ferramentas metabolômicas para caracterização molecular de parasitos no Maranhão. “A perspectiva de posterior identificação desses metabólitos vai permitir a interpretação de suas vias bioquímicas e será primordial para a descoberta de marcadores moleculares associados a fenótipos de tolerância ou suscetibilidade na leishmaniose visceral”, prosseguiu.

A pesquisa  levou Juliana ao podium do Prêmio Fapema 2021, na categoria Jovem Cientista. “Ter esse reconhecimento é muito importante para a gente perceber que o nosso trabalho não está sendo em vão” comemora Juliana. Ela adiantou que vai continuar os estudos na área. “Eu pretendo continuar trabalhando com parasitos, especialmente como doenças tropicais negligenciadas, talvez até com outras além da leishmaniose”, concluiu. 

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