Foram identificados microplásticos em 100% das ostras analisadas e contabilizados 392 itens de microplástico em 75 ostras.
Scarlleth Patricia Salomão da Silva
Estudante do 3ºª série do Curso Técnico em Meio Ambiente no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Maranhão (IFMA) – Campus Itapecuru-Mirim. Cursou o Ensino Fundamental na Escola Integrada Mariana Luz. Atuou em projetos de Extensão sobre Identidade e pertencimento: Vivências afro-brasileiras em comunidades em Itapecuru Mirim e no Projeto Educação na Tela: IFMA – Itapecuru-Mirim vai ao cinema. Atua em projetos de iniciação científica sobre qualidade da água do Rio Itapecuru; Confecção e eficiência da armadilha de pesca, utilizando materiais alternativos, no manejo do camarão da Amazônia; e Ecologia alimentar da ostra nativa Crassostrea Gasar. Tem experiência na área de recursos pesqueiros e Engenharia de Pesca.
Os estuários são zonas de transição entre o ambiente continental e o marinho e possuem um importante papel como fonte, acumulação e transporte de microplásticos. Porém, a correlação entre a poluição microplástica e organismos aquáticos ainda é pouco conhecida.
O desejo de identificar e caracterizar essa ocorrência levou Scarlleth Patricia Salomão da Silva, do Instituto Federal do Maranhão (IFMA) – Campus Itapecuru-Mirim, a realizar a pesquisa Primeira evidência de ingestão de microplástico por ostra nativa Crassostrea gasar (Adanson, 1757) em um estuário amazônico – Maranhão.
Com o trabalho, a estudante da 3ºª série do curso Técnico em Meio Ambiente conquistou o terceiro lugar no Prêmio Fapema 2019, na categoria Pesquisador Júnior. A pesquisa, orientada pelo professor Caio Brito Lourenço, doutor em Ecologia Aplicada pela Universidade de São Paulo (USP), foi realizada em parceria com a professora Izabel Funo, coordenadora do Núcleo de Maricultura do IFMA Campus Maracanã, com doutorado em Recurso Pesqueiro e Aquicultura pela Universidade Federal Rural de Pernambuco.O estudo surgiu com o objetivo principal de analisar o conteúdo estomacal da ostra e identificar se ela poderia estar se alimentando de espécies de fitoplâncton potencialmente tóxicas”, afirmou a estudante premiada. “Com o início da pesquisa, identificamos a presença de microplásticos e, como não existem estudos sobre essa situação com ostras no Maranhão, resolvemos redirecionar o trabalho”, ressaltou.
“O Prêmio FAPEMA possibilita mostrar que os alunos do ensino médio e técnico são capazes de desenvolver pesquisas de qualidade e nos estimula a desenvolver mais pesquisas.”
Micropartículas plásticas em todas as ostras
A pesquisa, além de constatar o primeiro caso de ingestão de microplástico por ostra nativa no estado, demonstrou que há grandes concentrações dessa ocorrência na região costeira amazônica. “Cem por cento das ostras apresentaram microplástico no seu conteúdo estomacal, sendo a fibra a principal forma encontrada”, informa a estudante. De acordo com Scarlleth, isso indica que as fibras estão sendo lançadas no corpo hídrico pelas mais diferentes fontes.
Foram identificados microplásticos em 100% das ostras analisadas, sendo contabilizados 392 itens de microplástico em 75 ostras. A abundância de microplástico nas ostras variaram de 1 a 12, sendo uma média de 5 itens por cada ostra examinada, não havendo diferença em relação aos períodos temporais. A maior parte tem dimensão de 100 a 1 mil micrômetros. “São partículas diminutas”, informou a jovem pesquisadora. A maioria do material plástico coletado tinha era incolor ou azul. “Isso é importante para que, em outras etapas do estudo, consigamos fazer inferências sobre as origens dessas partículas”, assinalou.
“Na região estudada havia um grande problema com poluição plástica, com restos de sacolas, redes de pesca, materiais descartáveis, pneus e garrafas pets”, informa o professor Caio Lourenço,
Para a pesquisadora, o trabalho demonstra, ainda, que as ostras são excelentes bioindicadores de poluição por microplástico em ambientes estuarino e costeiro. “Novas pesquisas devem ser desenvolvidas com objetivo de identificar o transporte e o destino dos microplásticos no ambiente aquático e nos organismos, a fim de avaliar os riscos ecológicos e os riscos de exposição à saúde humana”, prosseguiu.
“A ostra é um item alimentar muito consumido no Maranhão, principalmente in natura e, como o local do nosso e estudo é uma área de pesca desses organismos, podemos dizer que já existem pessoas se alimentando de plástico na região amazônica” pontuou Scarlleth Silva.
Apenas um estuário foi analisado e a pesquisadora aponta a necessidade de expandir para outros locais, além de serem examinados também os rios. “Novos estudos devem ocorrer, também, com análise da presença de microplásticos em mais períodos do ciclo hidrológico”, avaliou. “A análise dos conteúdos exige, ainda, um tempo longo no microscópio para contabilizar, identificar, caracterizar e medir os microplásticos”, finalizou.
Consequências no organismo e alternativas
De acordo com o professor Caio Lourenço, os impactos do microplástico ingerido pelo molusco são físicos e químicos. “Pode ocorrer um dano ou lesão ao sistema digestivo ou lesão, além de afetar o metabolismo, com perda de peso e alterações na taxa de crescimento e na reprodução”, assinalou. “O microplástico também afeta os estágios larvais dos moluscos”, observa o professor.
Esses mariscos contaminados acabam chegado na mesa de refeição as famílias. “O consumo de mariscos pode ser uma via de ingestão de microplásticos”, ponderou o professor. “É algo que deve ser visto com muita atenção, pois estamos ingerindo microplástico”, afirmou.
O professor sugere interromper essa disseminação com a drástica redução do consumo de componentes plásticos como copos descartáveis, sacolas, canudos, garrafas e pneus. “Deve haver o incentivo à utilização de transportes públicos e ferroviários”, pontuou. “E os tecidos sintéticos podem ser substituídos por fibras naturais ou de matérias biodegradáveis”, finalizou
Metodologia da pesquisa
O estudo foi desenvolvido nos anos de 2018 e 2019, com recursos financeiros da Fundação de Amparo à Pesquisa e ao Desenvolvimento Tecnológico do Maranhão (FAPEMA), por meio do edital Geração ciência – 02510-18, e contou, ainda, com bolsa de iniciação cientifica (PIBIC) concedida pelo IFMA.
“A atuação do meu orientador, professor Caio Lourenço, foi indispensável na realização da pesquisa, por me ensinar como fazer ciência e sobre a importância dela para se transformar a realidade em que vivemos”, afirmou a estudante do IFMA.
O trabalho se encontra em fase de submissão de artigo em revista internacional. As coletas foram realizadas durante seis meses, em três períodos de coleta: novembro de 2018, janeiro e março e 2019. Esses períodos foram estabelecidos com o propósito de identificar padrões na quantidade de microplástico, com a precipitação de chuvas que promove o aumento do escoamento superficial e da vazão. “Janeiro e março são meses de maior precipitação pluviométrica – superior a 300 milímetros – e novembro é o fim do período de estiagem, com precipitações inferiores a 200”, informou a pesquisadora Scarlleth Silva.
Foram selecionados 25 unidades de ostras, aleatoriamente, de diversos tamanhos, nas raízes do mangue em área do município da Raposa, a 27 quilômetros de São Luís. Ainda em campo, os organismos foram lavados com água doce e limpos com escova com cerdas de nylon. Foram mensuradas as variáveis biométricas com uso de um paquímetro de precisão de 0,01mm e uma balança digital de três dígitos.
Com auxílio de bisturi e tesoura cirúrgica, os estômagos foram extraídos e cortados longitudinalmente, os seus conteúdos foram removidos com jatos de água e devidamente acondicionados.
Para minimizar a contaminação por microplásticos no laboratório, luvas foram usadas durante os experimentos, todos os líquidos utilizados para análise foram filtrados, as vidrarias e utensílios foram enxaguados três vezes com água destilada filtrada e cobertos com folha de estanho antes e após o uso. E a área do microscópio foi limpa antes da análise das amostras. As lâminas foram examinadas antes da adição da amostra, para verificar a contaminação por partículas.
Saiba mais sobre o microplástico
De acordo com o orientador da estudante, Caio Brito Lourenço, e professor do IFMA Campus Itapecuru-Mirim, os microplásticos são partículas plásticas com tamanho inferior a 5 milímetros e superior a 0,1 micrômetros – maior, portanto, que os nanoplásticos. “Eles podem ser encontrados na forma de fragmentos, esferas, filamentos ou partículas e é uma realidade em todos os sistemas aquáticos, como resultado do impacto humano”, ressaltou.
A microfibra é o microplástico mais comum no ambiente aquático e é oriundo, por exemplo da sua liberação durante a lavagem de roupas fabricadas com fibras sintéticas. Já as esferas plásticas podem se originar de produtos cosméticos, como os esfoliantes. E o pneu descartado se fragmenta em partículas menores que também podem chegar ao sistema aquático. “Quando esses itens chegam ao corpo aquático, sofrem vários processos que os tornam partículas ainda menores”, assinalou Caio Lourenço.
O microplástico não é visível a olho nu e acaba não sendo uma ameaça tão clara. Ele tem diferentes composições, principalmente, o polietileno tereftalato (PET), o PVC, o polipropileno, poliestireno e o nylon.
O microplástico primário é a matéria-prima produzida pelo petróleo para confeccionar outros itens plásticos, como sacolas, garrafas e que não sofreu nenhuma fragmentação. E o microplástico secundário, por sua vez, é a categoria mais comum, resultante da fragmentação de outros itens plásticos de maior tamanho, como garrafa, copo, canudo, ou roupas compostas por tecido sintético, em decorrência da ação solar ou física.
“Atualmente há cerca de 5 trilhões de itens plásticos e 250 mil toneladas de plásticos no ambiente”, concluiu o professor.
Excelente trabalho minha filha.
Estou lisonjeada com a publicação desta reportagem acerca da pesquisa por mim desenvolvida. Excelente abordagem!
Jovem de talento,orgulho itapecuruense!