“Além das lendas” passa a integrar um portfólio em quadrinhos em que consta
a história da Balaiada, a Fundação de São Luís e o o romance "O Mulato".
Iramir Araújo
Detentor de mestrado e graduação em História pela Universidade Federal do Maranhão. Roteirista de quadrinhos e animação. Professor da Escola de Governo do Maranhão e da Formação Faculdade Integrada.
São Luís submersa num futuro pós-apocalíptico, uma chamada de uber na Praia Grande com direito a perseguição de moto… Uma viagem à ilha dos Lençóis, uma fuga da polícia com ponto final no Palácio das Lágrimas e a história de uma paixão entre a filha do cacique e o guerreiro mais corajoso da tribo Tupinambá…
Esse é um fragmento do cenário de cinco histórias que contam (e vão além das) lendas de São Sebastião, do Palácio das Lágrimas, da praia do Olho d’Água, da Manguda e da Serpente Encantada, colecionadas em um único livro. A obra contou com o apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa e ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico do Maranhão (FAPEMA) e do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas no Maranhão (SEBRAE), por meio do Edital Economia Criativa nº 23/2019.
Com roteiro do historiador, professor, artista gráfico e desenhista Iramir Araújo, o livro em quadrinhos “Além das Lendas” (Edições Tecitura/Ira Quadrinhos, 68 páginas) lançado, virtualmente, em maio deste ano, em plena pandemia da Covid-19, tem com foco a cultura e a história do Maranhão. “Recontamos as lendas, sem perder a sua essência”, leciona Iramir que é mestre e graduado em História pela Universidade Federal do Maranhão (UFMA).
O projeto se iniciou com a pesquisa sobre algumas lendas que integram o imaginário ludovicense e maranhense, seguido pela seleção, roteirização e o convite a cinco artistas para interpretarem visualmente os roteiros. “Não apenas retratamos a lenda, mas contamos uma estória”, avalia Iramir.
A lenda da Serpente se tornou uma ficção científica. “Foi difícil, mas aceitei antes de receber o roteiro”, afirmou Marcos Caldas. “Foi preciso toda uma desconstrução para realizar o trabalho”, prosseguiu Marcos, artista gráfico e designer com experiência na celebrada revista norte-americana Mad, com seu humor satírico desde 1952.
A lenda da praia do Olho d’Água é uma história de amor dos antigos Tupinambás que habitavam a ilha naquela região. No livro, a narração é feita por um jovem que está na praia com a sua namorada: paixão entre a filha do cacique e o guerreiro mais corajoso da tribo. “Foi um desafio, pois foi a minha primeira publicação”, ressaltou a arquiteta e ilustradora Amanda Belo. Ela deu forma a “Das lágrimas de Arabi”, sobre a origem da praia do Olho d’Água.
No enredo da Manguda, uma menina está na Praia Grande e chama um uber para voltar à sua casa, na Praça dos Remédios e, entre o pedido e a chegada o carro, ela é abordada por dois homens e depois é seguida pelos suspeitos numa moto. O premiado mestre em Artes Visuais, Beto Nicácio, foi o responsável pelos desenhos. “Eu gosto de lendas, do Centro Histórico, da fantasmagoria”, afirmou. “O nosso trabalho é de construção de uma narrativa”, prossegue. “O desenhista de quadrinhos é mais que um desenhista, é um contador de histórias”, avalia.
“A gente investiu pra mostrar que há trabalho de qualidade no Maranhão”, afirma Ron Freire que emprestou seu traços ao “Rei Encoberto”, na narrativa sobre a lenda de Dom Sebastião. O touro encantado é apresentado por meio de três mulheres que pesquisam sobre a lenda na Biblioteca Pública. Elas vão até a ilha dos Lençois pra invocar o rei encorberto e desencantá-lo. “A gente tem que dar visibilidade ao nosso trabalho”, pontua Ron que conquistou o “Selo Seleção Cátedra 10” da Unesco, em 2017.
Dois ladrões fugindo da polícia se escondem na antiga Faculdade de Farmácia, em frente à Igreja de São João, e movimentam a trama da lenda do Palácio das Lágrimas, como ficou conhecido o prédio que, antes de pertencer à universidade, foi palco de uma história assombrosa. O “Palácio que chora” foi quadrinhado por Ronilson Freire, que já trabalhou para editoras norte-americanas, canadenses e inglesas e, hoje, atua com a editora francesa Soleil. “A internet veio pra possibilitar tudo isso, pois o mercado local é muito incipiente”, analisou Iramir Araújo.
Cultura, arte e literatura maranhense em quadrinhos
“Além das lendas faz parte de um projeto que já desenvolvo desde 2008 que é fazer quadrinhos com aspectos da história, da cultura e da literatura do Maranhão”, informa Iramir. “A ideia é valorizar as nossas raízes e levar isso para a juventude, aos estudantes”, complementou.
Os objetivos do projeto foram alcançados. “A gente conseguiu criar cinco estórias inspiradas em lendas maranhenses e chamar artistas pra desenhar cada uma delas. Isso foi plenamente satisfeito. Criamos as estórias, lançamos o livro e já distribuímos para bibliotecas públicas do estado e do município, no Liceu, pra escola da Maioba”, explicou.
A professora Rossana Mafra Azevedo, do Liceu Maranhense, celebrou o trabalho. “Ele é voltado ao incentivo à leitura e é muito bom para os alunos do ensino médio pois é uma forma de estimular a apreciar cada vez mais o processo de letramento”, avaliou. “Isso demonstra que a leitura pode ser feita de várias formas, através de revistas, música, dança, de uma peça teatral e estórias em quadrinhos”, complementou. “Cada vez mais as pessoas dizem que não gostam de ler textos muito longos e realizar esse trabalho em quadrinhos tem também esse objetivo de levar uma informação mais visual”, ressaltou Iramir.
Para realizar o trabalho foi necessário realizar uma pesquisa visual sobre o cenário e a indumentária. “Eu pesquisei várias lendas do Maranhão, mas achei que essas são representativas por serem mais conhecidas”, afirmou Iramir. “A exploração das histórias de São Luís é muito bom e demonstra a qualidade do trabalho, pois, além de possibilitar a ampliação da leitura, desenvolve a curiosidade cultural”, avaliou a professora Rossana Mafra. “É maravilhoso, a Fapema e o Sebrae estão de parabéns e os leitores agradecem”, celebrou.
Lançamento e projetos futuros
A edição do livro foi lançada, virtualmente, no dia 16 de maio. A noite de autógrafos aconteceu em 9 de setembro. E o trabalho ganhou grande repercussão na imprensa maranhense e conquistou espaço na Revista Carta Capital.
A pandemia acabou atrasando todo o processo. Mas a economia criativa não para. “Descobri umas lendas interessantes do interior do estado e eu pretendo focar nelas no futuro”, afirma Iramir. Ele tem trabalhado aspectos da história, como a Balaiada e a fundação da cidade de São Luís, e da literatura com O Mulato. “Nesse momento eu estou realizando Úrsula de Maria Firmina dos Reis, que será lançado no próximo ano”, destacou. “Tou pesquisando pra trabalhar O Crime da Baronesa e estou nas primeiras conversas com a Fundação Josué Montello para fazer Os Tambores de São Luís”, revelou.