Pesquisadora analisa a construção de personagens masculinos e femininos e é premiada na categoria Popvideo Ciências
Luisa Mara Silva Lima
Estudante do curso de Licenciatura em Letras na Universidade Estadual do Maranhão (UEMA), em Caxias.
Bolsista do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica (PIBIC/FAPEMA). Integrante do grupo de pesquisa Literatura, Artes e Mídias (LAMID).
Toda obra literária é elaborada em determinada contexto social e por ele o a autor é influenciado. Por isso a literatura, assim como outras formas de expressão artística, é um excelente objeto de estudo para a compreensão da cultura e da estrutura social de determinado período histórico.
Nesse contexto, Luísa Mara Silva Lima, estudante da Universidade Estadual do Maranhão (UEMA), do curso de Licenciatura em Letras – Língua Inglesa, Língua Portuguesa e respectivas Literaturas, buscou analisar um recorte das obras de Aluízio Azevedo para entender como seus romances dialogam com as características da sociedade brasileira no século XIX.
Principal expoente da estética Naturalista no Brasil, o maranhense Aluísio Azevedo foi um escritor, jornalista, cônsul e caricaturista com uma rica produção literária de romances, peças de teatro e contos, concentrada entre as décadas de 1880 e 1890. Dentre seus romances, um dos mais destacados é “O Cortiço”, publicado em 1890.
A pesquisa permitiu compreender melhor como as personagens masculinas e femininas nas obras “Casa de pensão” (1883), “O coruja” (1883) e “Uma lágrima de mulher” (1879) são representadas. “Também buscamos compreender se elas transgridem ou são reflexos de certos estereótipos de gêneros que, sabemos, ainda hoje manifestam seus traços na nossa cultura”, explica a pesquisadora. Ele foi premiada na última edição do Prêmio FAPEMA com o 3° lugar na categoria Pop Vídeo Ciência – com a produção de vídeo em que apresenta uma síntese de sua pesquisa. Os vencedores são definidos por voto popular.
Desde 2019 a pesquisadora já realiza estudos acerca da obra de Aluízio Azevedo e a qualidade do seu trabalho pode ser observada através do reconhecimento de seus pares. Na edição 2021 do Prêmio Fapema Luísa Mara já havia sido premiada na categoria Jovem Cientista com a análise dos personagens masculinos do autor nas obras “O Mulato” (1881), “O Homem” (1887), “O Cortiço” (1890) e “A mortalha de Alzira” (1894).
Para realizar os estudos de ambos os trabalhos, a pesquisadora contou com o auxílio de uma importante ferramenta digital: AC/DC (acesso a corpos, disponibilização de corpos, da Universidade de Oslo), que produz anotações, de forma semiautomática, de textos em língua portuguesa. “Desde 2019, contamos com a ajuda da ferramenta AC/DC para contribuir com a construção de um robusto banco de dados sobre informações das personagens azevedianas”, explica Luísa.
Metodologia
O procedimento metodológico foi realizado em três etapas: a primeira foi a leitura das obras, realizada digitalmente através do acervo do Portal Maranhão. Em seguida foram realizadas pesquisas bibliográficas para enriquecer o arcabouço teórico que norteia as análises. E, por fim, foi realizado o trabalho manual utilizando a ferramenta digital. “Para computacionarmos essas personagens no corpus Obras, do AC/DC, criamos regras em que marcamos os nomes próprios, os pronomes de tratamento das personagens e o tipo de personagem (histórica, ficcional e religiosa). Esse processo facilitou a busca no corpus por padrões léxico-gramaticais que indiquem descrição humana. Após uma busca e análise dos dados encontrados na Linguateca, no corpus Obras, houve uma construção de quadros com as descrições encontradas,” revela a estudante.
Com a pesquisa e os dados obtidos, foi observado que os personagens masculinos possuem um papel de maior destaque na narrativa dos romances. Sessenta e dois por cento dos personagens mencionados nas obras são homens – o que reflete o papel social do homem no espaço androcêntrico do contexto oitocentista. “O homem tinha uma função mais ativa no âmbito social, político, cultural e, principalmente, no espaço econômico. Já a mulher ocupava um lugar mais ativo nas tarefas domésticas e na educação familiar, tendo inúmeras passagens que evidenciam através da caracterização a função da mulher enquanto esposa, preocupada com o bem-estar familiar e cuidados com os filhos,” analisa a pesquisadora.
Mais do que a quantidade de vezes que cada personagem é citado, o trabalho de Luísa também analisa a forma pela qual esses personagens são apresentados. “Percebemos que Azevedo compôs personagens masculinos com caracterização rica de adjetivos, sendo sustentados pela sua classe social e caráter, sempre mencionados pelo nome próprio ou pela profissão, como o sr. Barão, o médico, o advogado. As mulheres, por sua vez, são vistas como elementos de luxo e geralmente associadas a um perfil masculino, sendo tratada como a filha do pescador, a esposa de Teobaldo ou a irmã de Coqueiro,” explica Luísa.
Para a autora, o trabalho possibilita visualizar o funcionamento social do século XIX, além de demonstrar as possibilidades de estudos ao se combinar os saberes dos campos de linguística computacional, literatura e análise do discurso. A pesquisadora também contou que vai seguir analisando obras maranhenses através desse procedimento metodológico. Em estudos futuros serão acrescentadas as obras “Úrsula” (1859) e o conto “A Escrava” (1887), da escritora Maria Firmina dos Reis, importante figura literária do século XIX. “A autora maranhense retrata o cenário crítico vivido pelas minorias no século XIX. Assim, estudaremos um recorte do cenário social oitocentista por meio da escrita de Aluísio Azevedo e de Maria Firmina dos Reis, com foco na descrição das personagens,” conclui.