A fibromialgia é caracterizada por dor crônica generalizada, fadiga, distúrbios do sono, dificuldades de memória e concentração

Lucas Soares Brito é médico graduado pela Universidade Federal do Maranhão (UFMA). Pesquisador na área de dor e cuidados paliativos, foi bolsista de iniciação científica pela FAPEMA, CNPq e UFMA. É criador do Poadcast “O Som da Saúde” (instagram: @osomdasaude), projeto de extensão vinculado à UFMA. Integra o Grupo de Pesquisa Laboratório de Inovações Tecnológicas aplicadas à Saúde.
Vencedor do Prêmio FAPEMA 2024 na categoria “Jovem Cientista na área da Saúde”, ele trata, nesta entrevista sobre a sua pesquisa “Análise da associação entre o impacto da fibromialgia com o coping espiritual e otimismo em pacientes do ambulatório de dor crônica do HU-UFMA”
Revista Inovação – Explique em que contexto nasceu essa pesquisa.
Lucas Brito –A pesquisa foi realizada na Casa da Dor, que é um local ligado ao Hospital Universitário da UFMA, e que se localiza em frente ao Hospital Presidente Dutra e lá ocorrem ambulatórios de dor crônica.
“Quanto mais otimista a paciente é,
menos impacto da fibromialgia ela vai ter“
Revista Inovação – E o que significa “dor crônica”?
Lucas Brito – A dor crônica é uma subespecialidade da anestesiologia. E lá, na Casa da Dor, ocorrem esses atendimentos ambulatoriais com pessoas com fibromialgia, cefaléia crônica e alguma outra dor crônica causada por alguma enfermidade, enfim, e lá eles fazem esse acompanhamento.
Revista Inovação –Qual o principal público que é atendido lá ?
Lucas Brito – Há um grande contingente de pessoas, principalmente mulheres (porque a fibromialgia é uma doença que acomete muito mais mulheres do que homens), que fazem o acompanhamento lá.
Revista Inovação – Então foi lá que se desenvolveu essa sua pesquisa premiada?
Lucas Brito – Sim, lá há várias pesquisas que acontecem e a sobre pessoas com fibromialgia é uma das linhas de pesquisa que acontece lá. Há várias pesquisas acontecendo ao mesmo tempo com essas pessoas sobre constipação, vida sexual e sobre otimismo e espiritualidade, que foi justamente essa que eu desenvolvi.
Revista Inovação – Como foi realizada essa sua pesquisa?
Lucas Brito – Nós aplicamos questionários internacionais, que são validados nacionalmente para a língua portuguesa. Íamos para uma sala com a paciente, explicava o que era a pesquisa e de que forma isso poderia colaborar para o desenvolvimento de novas estratégias para lidar com pessoas com fibromialgia. Convidava a participarem, elas assinavam o termo de consentimento e se fazia a coleta de informações por meio dos questionários.
Revista Inovação – Quais questões foram levantadas?
Lucas Brito – Utilizamos, principalmente, três questionários: um questionário sobre o impacto da fibromialgia, e outro, da Organização Mundial da Saúde, sobre a espiritualidade que, na verdade, é um sub questionário de um grande questionário sobre qualidade de vida. O terceiro era um questionário que tratava sobre otimismo, que é o Life Orientation Test Revised, que busca quantificar o nível de otimismo.
Revista Inovação – É possível mensurar otimismo e espiritualidade ?
Lucas Brito – Essas variáveis não são coisas contábeis, idade ou o nível de colesterol no sangue, algo que a gente pode ver ali através de um número. Então, por isso, existem esses questionários, que precisam ser validados para saber se eles realmente funcionam para aquilo que a gente está buscando. E, através deles, se consegue obter uma visão numérica sobre a quantificação de otimismo, espiritualidade e impacto da fibromialgia.
Revista Inovação – E quais foram as etapas seguintes da pesquisa?
Lucas Brito – Depois disso, fizemos uma análise de associação através da estatística. E, embora a literatura internacional aponte que exista, sim, uma associação estatística significativa entre a espiritualidade e o impacto da fibromialgia, na nossa pesquisa se encontrou uma associação inversa entre o otimismo e o impacto da fibromialgia. Ou seja, a gente encontrou que geralmente quanto mais otimista a paciente é, menos impacto da fibromialgia ela vai ter e vice-versa: quanto mais menos otimista ela é, mais impacto da fibromialgia ela vai ter.
“A Fapema entrou nessa trajetória de forma fundamental”
Revista Inovação – Foi uma pesquisa que acompanhou os casos por longo período de tempo?
Lucas Brito – Não ! E é importante dizer que foi uma pesquisa transversal, que só consegue ver naquele momento ali. É como se a gente fizesse uma foto. Para estabelecer uma relação cronológica, do que veio primeiro, se a pessoa primeiro ficou mais deprimida, menos otimista, para depois ter um pior impacto, ou se foi o contrário, são necessários o desenvolvimento de novas pesquisas.
Revista Inovação – E como foi o apoio da Fapema?
Lucas Brito – A Fapema entrou nessa trajetória de forma fundamental. Porque pesquisa é algo que demanda recursos financeiros. Essa pesquisa, especificamente, demandou impressões dos questionários, transporte e deslocamento. Mas a Fapema entra nesse sentido de incentivar pesquisas futuras, porque para estabelecer essa relação cronológica que eu mencionei, qual variável está gerando, se é o otimismo que está gerando o impacto da fibromialgia pior ou se é o contrário, são necessários estudos maiores, mais caros, que são chamados estudos de coorte, que vão acompanhar essas pacientes ao longo do tempo. Porque essa nossa pesquisa foi transversal, como uma foto daquele momento. A gente viu a paciente uma vez e coletou aqueles dados dela, mas para estabelecer uma relação temporal, é necessário que a gente acompanhe a paciente. E isso torna o estudo muito mais caro e, assim, o financeiro é uma variável que impacta na resolutividade, na dinâmica e no desenvolvimento das pesquisas. Então a Fapema foi fundamental com a ajuda financeira, pois, mesmo na pesquisa transversal, a gente tem custos.
Revista Inovação – E qual é o impacto social dessa pesquisa?
Lucas Brito – O estudo impacta na sociedade, principalmente nas pessoas que vivem com a fibromialgia. Vai impactar justamente no manejo dos pacientes, de como a gente vai abordar principalmente na frente não medicamentosa. A medicamentosa a gente já sabe: vai tratar com analgésicos, com gabapentinoides, para neuropáticas, antidepressivos também entram aí nessa linha, mas essas pessoas também, assim como qualquer outra doença, têm grande impacto de melhora quando se trata na frente não farmacológica, principalmente nesse caso da fibromialgia.
A atividade física é algo fundamental no tratamento dos pacientes e também a gente está descobrindo agora, que espiritualidade, otimismo, uma vida melhor, lazer, também tem impacto significativo no desenvolvimento dessa doença.
Revista Inovação – Qual a situação do Maranhão em relação a essa doença?
Lucas Brito – Aqui, no Maranhão, elas estão organizadas, se eu não me engano, na Associação Maranhense de Pessoas com Fibromialgia. Mas elas são bem organizadas e há um número cada vez maior de pessoas com esse diagnóstico.
Revista Inovação – Como saber se alguém tem essa doença?
Lucas Brito – Ela é subdiagnosticada, por ser uma doença invisível. Não é uma doença que a gente consegue ver, tangenciar, não tem um exame que diga assim, de forma definitiva, é fibromialgia. É um diagnóstico clínico, em que se precisa excluir algumas coisas antes. Também, é preciso pensar em alguns diagnósticos diferenciais.
Revista Inovação – Como as pessoas recebem esse diagnóstico?
Lucas Brito – É um diagnóstico que, muitas das vezes, as pessoas da família do paciente nem acreditam, porque não é algo tangível. Não é como se houvesse um hematoma ali na pele da pessoa que se está visualizando que se supõe que a pessoa sente dor. É uma dor crônica, com cefaléia e insônia, que também acometem muitos pacientes.
Revista Inovação – E quais são os próximos passos da pesquisa?
Lucas Brito – Eu pretendo fazer minha residência com o doutor João Batista Santos Garcia, que foi o meu orientador e professor titular da UFMA. E, depois, eu pretendo voltar para o mestrado, com essa linha de pesquisa.
